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Há vida além da microcefalia? Sim, a arte nos dá os porquês!
Cabeças luminosas
VITOR HUGO BRANDALISE – O ESTADO SP
03 Abril 2016
Durante quase meio século, o ator italiano Bobò, hoje aos 80 anos, viveu preso num manicômio, porque tem microcefalia. Foi salvo pelo diretor Pippo Delbono, que acreditou no homenzinho que sabia dançar. Na história da dupla de artistas, cenas que o Brasil pode evitar quando crescerem os filhos do zika.
Cenas de um filme que ainda não vimos por aqui: dois homens montam numa lambreta, um muito alto, outro baixinho. O homem alto (1,93 metro) usa um capacete amarelo, que lhe cabe justo. Na cabeça do baixinho (menos de metro e meio), o capacete cinza sobra e balança. Percorrem uma estrada sinuosa, à noite, até encostar numa cantina. Entram na bodega e observam a placa acima da porta: “Está aberto o manicômio!” Alguém toca um acordeom, enquanto eles comem frente a frente. O mais alto fatia a carne para os dois e limpa com um guardanapo o molho de tomate da boca do baixinho, que não se queixa.
Pippo Delbono, 56 anos, ator italiano e diretor de teatro e cinema, é o grandalhão. O pequenino, também ator, 80 anos e 1,49 metro, é conhecido apenas como Bobò. Tem microcefalia, provavelmente com fundo genético.
Os dois homens prosseguem na lambreta até um hotel, onde se deitam, numa cama king size. Escolheram a suíte “fundo do mar”, com golfinhos pintados na parede azul. Cada qual está num canto do leito, bem afastados um do outro. Adormecem. O mais alto acorda no meio da noite. O baixinho canta ou reza pra que o outro volte a dormir.
Quem cuida de quem? Quem protege quem? Duas outras cenas, desta vez da vida real, explicam melhor a relação desses dois: num hospital psiquiátrico, o homem pequenino está triste. Vive encerrado ali há quase meio século – entrou aos 14 anos e já tem 60. Abre a boca e grita, grita e grita, mas não sai nenhum som. Perto dali, num tablado de teatro, Pippo Delbono se desespera. Acaba de descobrir que tem aids, num tempo em que não era fácil conseguir remédios. Sente um desamparo grande e passa a viver na rua. Berra alto, mas ninguém o escuta. Nesse momento, qual dos dois tem menos voz?
São homens muito diferentes, e são dois homens iguais. Delbono criou o movimento Teatro da Raiva (“funciona como força criadora, porque dentro da raiva também há amor”), venceu importantes prêmios da dramaturgia europeia e tornou-se pupilo de luminares como Pina Bausch e Iben Nagel Rasmussen. Antes disso, até se consolidar no teatro, viveu maus bocados. Na década de 1990, deprimido por causa da doença incurável, decidiu buscar paz entre semelhantes. “Me chamam de louco, então vou me unir aos que são tachados assim”, dizia o ator, aos que perguntavam por que decidira dar aulas de teatro num manicômio. No hospital psiquiátrico de Aversa, cidade vizinha à sua Napoli, ele conheceu o homem pequenino – surdo, analfabeto, mudo, a quem todos chamavam Bobò. Delbono jamais ouvira falar antes em microcefalia. Quis saber por que o homenzinho (cujo nome, ele viu na ficha, é Vincenzo Cannavacciuolo) tinha aquele apelido. Ele estava lá há tanto tempo que ninguém mais sabia.
Leia a íntegra aqui:
Cabeças Luminosas O Estado SP 3 abril 2016